Apenas 16% dos empregados da Infraero lotados no Galeão (RJ) e em Confins (MG) se transferiram para as novas concessionárias que assumiram esses aeroportos no ano passado. Dos 1.255 funcionários que atuavam nos dois terminais, antes da privatização, nada menos que 1.046 preferiram recusar um generoso pacote de benefícios para fazer a migração para às empresas privadas e resolveram permanecer na estatal.
A decisão agravou o problema financeiro da Infraero. Para arcar com os vencimentos de quem ficou, a estatal precisa desembolsar R$13,8 milhões por mês. É uma despesa anual entre R$ 150 e R$ 200 milhões, levando em conta 13º salário e benefícios. O processo de migração ou permanência dos funcionários, conforme a opção feita por cada um foi concluído no primeiro trimestre.
Segundo fontes da estatal, não há funções suficientes e nem sequer espaço físico para abrigar todos esses funcionários no Santos Dumont (RJ) e na Pampulha (MG), terminais menores que continuam sendo administrados pela Infraero. Para não deixá-los ociosos, tem havido uma tentativa de realocação dos empregados para os setores da Polícia Federal e da Receita Federal dentro dos aeroportos concedidos – o que poderia reforçar as equipes responsáveis pelo atendimento a quem passa pelas inspeções obrigatórias de imigração e alfândega.
A estatal também tem oferecido incentivos para que esses empregados se transfiram para outras cidades ou estados. O processo de realocação, no entanto, é absolutamente voluntário. Se o empregado não quer ser “emprestado” à Receita ou à PF, nem fazer as malas e mudar-se para outro lugar do país, a Infraero fica de mãos atadas, já que ele tem estabilidade. Resultado: começam a surgir os funcionários sem mesa, sem estrutura, sem tarefas claras nos aeroportos.
Quando se leva em conta os três aeroportos – Guarulhos (SP), Viracopos (SP) e Brasília (DF) – que já haviam sido privatizados anteriormente, o “excesso” de trabalhadores mantidos na Infraero torna-se ainda maior: chega a 3.413 trabalhadores. Esse contingente deve crescer com a nova rodada de concessões preparada pelo governo e mostra o tamanho do desafio que tem a Infraero para manter suas finanças minimamente equilibradas.
Para resolver o problema de ociosidade na estatal, a Secretaria de Aviação Civil pede ao Ministério do Planejamento a liberação de R$ 730 milhões. Esse seria o dispêndio de um programa de demissões voluntárias que busca a adesão de 2,6 mil dos 13 mil empregados diretos da Infraero.
Na opinião do presidente do Sindicato Nacional dos Aeroviários (Sina), Francisco Lemos, a maioria dos trabalhadores da Infraero não deposita confiança suficiente no projeto das concessionárias para os aeroportos leiloados. Ele reconhece que as obras ficaram mais ágeis, quando tocadas pelo setor privado, mas faz ressalvas: “Essa é a única vantagem. As condições de trabalho e de operação ainda são melhores na Infraero”.
No pacote de benefícios negociado com o sindicato, antes da privatização dos aeroportos, o governo resolveu oferecer 1,2 salário-base por cada ano efetivamente trabalhado aos funcionários da Infraero que decidissem migrar para as concessionárias privadas (com emprego automaticamente garantido). A indenização tinha um limite de R$ 180 mil. Mesmo vinculados ao novo empregador, esses funcionários asseguraram o direito de retornar à Infraero até o fim de 2020, caso tenham qualquer problema de adaptação.
Os empregados da estatal são celetistas e podiam ser demitidos a qualquer momento. Foi justamente por causa do programa de concessões aeroportuárias, iniciado pela presidente Dilma Rousseff em 2012, que o governo se viu forçado a assinar um acordo coletivo com o Sina garantindo estabilidade ate 2018 – depois estendido a 2020. Só sete empregados por ano podem sofrer dispensa sem justa causa.
“Apesar do entusiasmo do governo, ainda vai demorar para sabermos se as concessões de aeroportos são um bom negócio para empresas privadas, Infraero, trabalhadores e passageiros”, afirma Lemos. Segundo ele, os salários oferecidos pelas concessionárias que assumiram os antigos terminais da Infraero são “relativamente semelhantes” aos pagos pela estatal. “Mas a insegurança é maior e as vantagens são menores”, acrescenta o sindicalista, referindo-se a gratificações não incorporadas, de forma permanente, aos vencimentos nominais.
De acordo com fontes da Infraero, o caso mais problemático é o do Rio de Janeiro. Dos 932 trabalhadores lotados no Galeão, só 156 foram parar no consórcio liderado pela Odebrecht e pela Changi, de Cingapura. No Santos Dumont, mantido sob gestão da Infraero, não há como reacomodar esse contingente de modo produtivo.
“Desde o início, a nossa preocupação era atrair o maior número possível de empregados da Infraero”, diz o diretor de pessoas e organização da concessionária Rio Galeão, Gabriel França. “Quando estudamos a primeira rodada de concessões, verificamos que a falta de pessoal experiente prejudicou a transição em algumas áreas”.
Logo de cara, ao entrar na administração do aeroporto, a empresa remeteu um questionário a todos os trabalhadores do Galeão e teve uma surpresa: mais de 50% não tinham interesse nenhum em sequer ouvir uma proposta. “Buscamos oferecer incentivos que são transitórios no setor público”.
De todos os aeroportos privatizados, o Galeão era onde os funcionários tinham maior idade média nos terminais da Infraero, chegando a quase 24 anos. “Quanto maior a idade e mais próximos da aposentadoria, a gente percebia mais resistência em fazer a migração para o privado”, relata França.
Valor Econômico
Por Daniel Rittner – De Brasília